Rio 2016

22 de Novembro de 1963. O Presidente Kennedy dá entrada no Parkland Memorial Hospital da Universidade de Southwestern com um tiro na cabeça. A história mostra que ele não resiste aos ferimentos, principalmente devido à desorganização das emergências norte-americanas. No final da década de 60, veteranos retornando do Vietnã começaram a falar que tinham melhor tratamento e chance de sobrevivência nas selvas de Saigon do que nas ruas de Detroit. Isso iniciou uma revolução nos EUA com pressão da opinião pública, onde o cuidado com paciente traumatizado e em situação de emergência começou a ser levado a sério.

Em 2015, Parkland Memorial Hospital da Universidade de Southwestern foi totalmente reformado e ganhou uma nova casa como podemos ver no vídeo abaixo.

Enquanto isso no Rio de Janeiro, também em 2015, a Cidade Olímpica de 2016…

Hospital Federal do Andaraí:
http://oglobo.globo.com/rio/justica-condena-uniao-por-problemas-no-hospital-do-andarai-12648969
(Obra que, desde 2012, ainda nem começou, e de novo, é o Hospital de Referência para as Olimpíadas. Piada.)

Hospital Federal de Bonsucesso:
http://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/redacao/2015/05/16/hospital-no-rio-tem-emergencia-funcionando-em-conteineres-ha-quatro-anos.htm
(4 anos de emergência nos conteineres. Outra piada, sem graça.)

Hospital Estadual Rocha Faria
http://blogs.oglobo.globo.com/blog-emergencia/post/com-equipamentos-quebrados-rocha-faria-sofre-com-falta-de-medico-565263.html
(Sem estrutura, como trabalhar?)

Hospital Estadual Getulio Vargas
http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2015/05/funcionarios-do-getulio-vargas-continuam-com-salarios-atrasados.html
(2015, salários atrasados, insumos intermitentes…)

Miguel Couto, Souza Aguiar, Lourenço Jorge, Salgado Filho…
Cansei de procurar de cada um… passe lá e veja por você mesmo.

A “solução” é mandar os turistas da olimpíada para a rede particular?
http://www.blogdogarotinho.com.br/artigo.aspx?id=19143

Porque eu gosto tanto do trauma? Ora bolas, tirando o aspecto médico apaixonante, a adrenalina e tudo mais, uma das coisas que me diverte, eu confesso, é o paciente… Na maioria das vezes ele é aquela pessoa de classe média, com plano de saúde que nunca pisou em um hospital público, vem pelo bombeiro e dá de cara com o Pronto-Socorro, inferno na terra (e por falar em inferno, não vamos nem falar sobre o Hospital da Posse, referência da rodovia Dutra). Fica assustada e quer transferência o mais rápido possível. Aí esbarra no Plano, que demora a transferir, fica P da vida, mas faz todos os exames pelo SUS e vai para casa, horrorizada, porém, viva. E nunca mais pisa no SUS ou quer saber do SUS. Reclama mais do plano, do que das condições de atendimento. Afinal “Saúde pública é assim mesmo”. Isso quando o Sistema não o mata ou a velocidade não foi fatal.

Choque de realidades.

Esse é o país que cediou a copa. Essa é a cidade que cediará as Olimpíadas. Esses são os hospitais que vão cuidar de você se você sofrer um acidente na rua. Ficou assustado? Deveria.
Luciano Hulk e Angélica foram pro SUS. Cristiano Araújo também.

Por que não temos um Parkland Memorial Hospital da Universidade de Southwestern padrão para o SUS? Por que nossos Hospitais Universitários não tem emergência (e se orgulham disso?)?

Eu tenho minhas teorias. Uma delas é porque Deus é brasileiro ou melhor, carioca. Se aqui tivesse desastre, furacão, terremoto, tsunami, terrorismo, bomba, mas bomba mesmo, (tiro, facada e granada são partes integrantes do pacote ser carioca) talvez levassem mais a sério a importância de um atendimento de emergência organizado. E também de um ensino de emergência, né? Ou não né?

Já que ninguém quer que pessoa que vá atender uma emergência médica seja um especialista em emergências médicas. Isso não precisa de especialista, segundo a Sociedade Brasileira de Clínica Médica. O mundo desenvolvido todo diz que precisa, mas o Brasil é diferente. Afinal não somos o mundo todo…
http://www.sbcm.org.br/site/index.php?option=com_content&view=article&id=1691:prioridade-a-medicina-de-urgencia-e-emergencia&catid=84:opiniao&Itemid=135

Ou mudamos, ou vamos continuar receber em um único hospital, já abarrotado de gente, 47 pacientes em menos de 1h, vítimas de uma colisão ônibus x ônibus.
Ou mudamos, ou nas próximas boates que pegarem fogo, continuaremos a bater cabeça e assistir jovens queimados agonizando sem o mínimo de dignidade.
Ou mudamos, ou nas próximas chacinas de Realengo ou Osasco, continuaremos a perder vidas que poderiam ser salvas com o atendimento sistematizado, organizado e rápido, aprendido no Iraque e Afeganistão.

21 de abril de 1985. O presidente Tancredo Neves morre após ser internado no Hospital da Base de Brasília (SUS) e depois transferido para o Hospital das Clínicas de São Paulo (SUS) com complicações diversas de um quadro abdominal agudo. Desde então, ao invés de mudarem o atendimento de emergência no Brasil, nossos governantes procuram o Israelita Albert Einstein para qualquer indisposição.

Em 2015, Hospital Estadual Carlos Chagas:
http://globotv.globo.com/infoglobo/extra-noticias/v/emergencia-do-hospital-estadual-carlos-chagas-funciona-de-forma-caotica/4159145/

O pior do Brasil é o brasileiro.

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